sábado, 9 de fevereiro de 2013

MINHA UMBANDA



REALMENTE O QUE E UMBANDA ?

Umbanda é uma religião heterodoxa brasileira, cuja evolução do polissincretismo religioso existente no Brasil foi resultado de motivações diversas, inclusive de ordem social, que originaram um culto à feição e moda do país.

O vocábulo é oriundo da língua quimbundo, de Angola, e significa arte de curar, segundo a Gramática de Kimbundo, do Professor José L. Quintão, citada na obra O que é a Umbanda, de Armando Cavalcanti Bandeira, editora Eco, 1970[1]. Já os autores de vertente esotérica fazem alusão ao sânscrito a partir da junção dos termos Aum e Bandha, o elo de ligação entre os planos divino e terreno. A palavra mântrica Aumbandhan teria sido passada de boca a ouvido e chegado até nós como A Umbanda.



História



Sessão de Umbanda no Rio de Janeiro

O sincretismo religioso no Brasil, ou seja, a mistura de concepções, fundamentos, preceitos, ritualísticas e divindades se processou num quádruplo aspecto: negro, índio, católico e espírita porque outros foram menos dominantes ou de modo superficial e restrito a certas áreas.

O marco inicial surge com a escravatura do índio feita pelos primeiros colonizadores no Brasil. Entretanto, o aborígene pelas suas características de raça, de elemento da terra, conhecedor das matas, espírito guerreiro exaltado, sem qualquer organização com um rudimento de estrutura social, tendo a liberdade como apanágio de toda sua vida, não aceitou o jugo da escravidão. Tinha, contudo, uma crença no espírito e suas religiões. A influência do índio contribuiu para a formação da Umbanda fornecendo elementos da sua mitologia e cultivos, tais quais, a Pajelança, o Toré, o Catimbó, entre outros. Ademais, o caboclo, ancestral do índio que incorporava em suas manifestações, foi consolidado na prática umbandista [2]

O colonizador, portanto, foi buscar nas terras africanas o elemento negro, o qual oferecia condições mais favoráveis para os misteres da lavoura, já conhecidos nas regiões de origem. Desse modo, houve um circuito branco-índio-negro que contribuiu sobremaneira para o complexo da formação brasileira, nele ressalvando, como uma constante a religiosidade em vários aspectos. Na época das senzalas, os negros escravos costumavam incorporar o que se conhece hoje como pretos-velhos, antigos escravos, que ao se manifestarem, compartilhavam conselhos e consolo aos escravos.

O sincretismo católico, produto da simbiose dos cultos de escravo e escravocratas no Brasil, chegou a tal ponto que se cultiva um orixá com nome e imagem do santo católico, não se podendo diferenciar em certas exteriorizações onde começa um onde termina o outro. São flagrantes os casos de São Jorge, Ogum, Nosso Senhor do Bonfim, Oxalá, São Cosme e São Damião, Ibeji, e Santa Bárbara, Iansã. Não raro, muitos chefes de terreiro mandam rezar missas e se declaram também católicos, além de haver um grande número de praticantes que frequentam as duas religiões. Houve, portanto, uma consolidação do santo católico, admitido já sob o aspecto de espírito superior, de guia-chefe ou como orixá, enquanto os candomblés procuraram mais se distanciar do sincretismo e não aceitar as imagens.

O primeiro relato histórico, segundo Cavalcanti Bandeira, cabe a Nina Rodrigues, falecido em 1906, quando já estava quase pronta a impressão do seu livro Os africanos no Brasil, referente aos estudos feitos entre 1890 e 1905, nos quais consta a descrição de um ritual praticado na Bahia, o mais semelhante da Umbanda atual, que é o seguinte:

Entre os casos que poderíamos citar, tomamos por sua importância à pastoral de um Prelado Brasileiro ilustre a descrição eloquentíssima do Cabula, por ele estudada, que mais não é do que uma instituição religiosa africana sob vestes católicas.

Diz d. João Corrêa Nery:

A Cabula: Houve alguém que disse ser grande e mais prejudicial do que pensamos, a influência exercida pelos africanos sobre os brasileiros. Parece mesmo que muito se tem escrito nesse sentido. Em certa região de nossa Diocese, tivemos, em nossa última excursão, oportunidade de observar a verdade desse asserto. Encontramos três freguesias largamente minadas por uma seita misteriosa que nos parece de origem africana. Nossa desconfiança mais se acentuou, quando nos asseveraram que antes da libertação dos escravos, tais cerimônias só se praticavam entre os pretos e mui reservadamente. Depois da lei de 13 de maio, porém, generalizou-se a seita, tendo chegado, entre as freguesias, a haver para mais de 8.000 pessoas iniciadas. Bem que agora esteja privada dos elementos mais importantes, que infelizmente possuiu outrora, ainda encontramos crescido número de adeptos. O tom misterioso e tímido com que nos falavam a seu respeito e a notícia da grande quantidade de iniciados ainda existentes, nos levaram, não só a procurar do púlpito invectivar essa tremenda anomalia, como também a tomar algumas notas que oferecemos à consideração e ao estudo dos curiosos. Graças a Deus nosso trabalho não foi inútil. Tivemos a "consolação" de ver centenas de cabulistas abandonarem os campos inimigos e voltarem novamente a N. S. Jesus Cristo, ao mesmo que tempo que, de muito bom grado, nos forneciam informações sobre a natureza, fins da associação que pertenciam. A nosso ver a Cabula é semelhante ao Espiritismo e à Maçonaria, reduzidos a proporções para a capacidade africana e outras do mesmo grau. Em vez de sessão, a reunião dos cabulistas tem o nome de mesa. O chefe de mesa é chamado de embanda e é secundado nos trabalhos por outros chamados cambones.



União Espiritista de Umbanda do Brasil, a Casa Mater de Umbanda

Pensa-se que a expressão embanda possa ser uma corruptela do termo Umbanda ou Quimbanda, mas de qualquer modo demonstra a antiguidade do ritual na Bahia, Espírito Santo e Rio de Janeiro, já no século XIX, onde teve a linha mestra de uma de suas origens sob certos aspectos.

Na descrição do ritual cabulista é identificado o bater das palmas, as vestes brancas, a disposição das velas em sentido cabalístico como nos riscados, a engira, hoje gira, o modo de aceitar um novo membro do corpo de médiuns da casa, em alguns a iniciação dos profitentes do culto, a chegada do santé que é o santo como hoje se diz, a marcação de pontos, além do cambone, o chamado assistente cambono.

Uma referência com outra data precisa se encontra no livro Religiões Negras, de Edison Carneiro, 1963, em que surge à tona o nome Umbanda ao referir: "nos candomblés de caboclo, consegui registrar as impressões umbanda e embanda, sacerdote do radical mbanda: Ké ké mim ké umbanda. Todo mundo mim ké Umbanda."

De acordo com Cavalcanti Bandeira, Edison Carneiro, em 1933, teria estado na Bahia para fazer essa verificação. Assim, teve a primazia de fixar num livro brasileiro a palavra Umbanda, sem qualquer alteração, com essa grafia, em relação a um fato no culto que estudou naquele estado.

Pode ser fixado o ano de 1905 para a Guanabara, como marco, quando João do Rio publicou as suas reportagens enfeixadas depois no livro Religiões do Rio, onde aprecia e relata todos os cultos, seitas e religiões existentes na época e por ele vistos, não se referindo ao nome Umbanda que, embora conhecido e usado nesse período ao que parece, não tinha galgado a evidência e nem definia um culto de largas proporções. Entretanto, sua prática no Rio de Janeiro remonta ao tempo do Império, quando na Serra dos Pretos Forros, no Lins de Vasconcelos, atual Estrada Grajaú-Jacarepaguá, pontificavam diversas casas de culto, cada uma dentro de uma linha tradicional africanista. Já no tempo da República se achavam espalhadas pelos diversos bairros, porém com a característica afro-brasileira bem nítida.

Sobressaíam-se os rituais de Angola, do Congo, de Guiné, Moçambique, Cabinda, Monjolo, Cassange, de Rebolo, Cabula, Muçurumi, como a Linha das Almas, Linha do Mar, Linha de Mina, e as chamadas Linhas Cruzadas, bem como a de Nagô.

Começou a fusão praticamente, depois da Luta dos Ogãs, na década de 1910 a 1920, pois os baianos que até então não se entrosavam nas cultuações, seguindo a tradição nagô dos candomblés (as macumbas como eram chamadas), foram aos poucos convivendo no conjunto religioso. Embora predominasse o culto de Angola, tinha uma apresentação distanciada da rigidez do misticismo baiano, como o Muçurumi do Rio de Janeiro, e os terreiros eram mais conhecidos como bandas ou pelo nome das entidades, ou dos seus dirigentes. Assim, muitos já haviam surgido no Morro do Castelo, de Santo Antônio, na Mangueira e de Morro de São Carlos, entre outros.

No conjunto de cultos bantos, no Rio de Janeiro, o nome Umbanda foi mais preponderante no decênio de 1920 a 1930, concorrendo para isso uma aglutinação pelos recessos motivados pelas perseguições havidas dos governos, pois, nessa época apenas se favorecia ao kardecismo. Mesmo assim, muitos centros foram surgindo, como por exemplo, a Tenda Espírita Mirim, fundada a 13 de outubro de 1924, praticando o ritual de Umbanda, sendo o nome comum de Tenda Espírita, que usavam os centros praticantes desse ritual. Na época não havia liberdade religiosa. Todas as religiões que apontavam semelhanças com rituais africanos eram perseguidas, os terreiros destruídos e os praticantes presos. Entre os inúmeros episódios desse tipo, destacou-se, por exemplo, o da chamada Quebra de Xangô, em Maceió, no estado de Alagoas, a 2 de fevereiro de 1912.[3]. Em uma ação organizada pela Liga dos Republicanos Combatentes, os mais importantes terreiros de Xangô foram destruídos na capital alagoana, tendo pais de santo e religiosos sido espancados e imagens de culto destruídas. A ação teve como um de seus líderes o ex-governador Fernandes Lima, e visou atingir o então governador Euclides Malta, conhecido por sua amizade com líderes de religiões afro-brasileiras.

Sales, citando Arthur Ramos, diz que o autor chama esse novo produto, a Umbanda, de jeje-nagô-mussulmi-banto-caboclo-espírita-católico.[4]Para Prandi[5] e Oliveira[6], a Umbanda deriva da macumba carioca, e surge a partir da inserção de kardecistas insatisfeitos com a ortodoxia que não permitia a manifestação de caboclos e preto-velhos por serem considerados "espíritos atrasados". Ambos os autores a reconhecem como religião brasileira, surgida nas primeiras décadas do séc. XX, um período de urbanização e industrialização, o que segundo os mesmos, propiciou e contribuiu para sua formação.

No período de 1930 a 1940 a situação das tendas e terreiros melhorou bastante através da liberdade consentida e depois assegurada por lei, em 1934. Também data desse ano o início do Cadastro Policial, quando eram tiradas as licenças para as chamadas Festas Africanas, na então 4º Delegacia Auxiliar, que também exigia licença para os incipientes Terreiros de Umbanda.

Diamantino Fernandes Trindade relata em seu livro Umbanda e sua História que o início da expansão do Movimento Umbandista coincide com a subida ao poder de Getúlio Vargas, em 1930. Seu regime, de caráter autoritário, se solidificaria, em 1937, com a criação do chamado Estado Novo. As primeiras lideranças da Umbanda foram, direta ou indiretamente, ligadas ao regime. Alguns terreiros exibiam em suas paredes fotos do ditador. Apesar do apoio ao governo, os praticantes ainda sofreram perseguições e repressões que durariam até 1945. Uma lei de 1934 enquadrava a Umbanda, o Kardecismo, as Religiões Afro-Brasileiras, a Maçonaria, entre outras, na seção especial de Costumes e Diversões do Departamento de Tóxicos e Mistificações do Rio de Janeiro. Trata-se do mesmo departamento que lidava com álcool, drogas, jogo e prostituição. A lei vigorou até 1964. Os cultos eram vítimas da extorsão em troca de proteção da polícia, prática atualmente comum nos jogos de azar. Quando contrariada, a autoridade se resguardava na justificativa de que a macumba dava cobertura a tipos considerados comunistas. De acordo com relatos da época, Ogum, o orixá sincretizado com São Jorge, era identificado na década de 1930, com o Cavaleiro Vermelho. Há relatos de que a perseguição do governo Washington Luís (1926 a 1930) foi bastante intensa do que no governo seguinte de Vargas, pois este último teria sido um frequentador assíduo dos cultos afro-brasileiros.

Pai Jaú, falecido em 1989, ex-atleta de futebol do Corinthians, declarou certa feita numa reunião do Superior Órgão de Umbanda do Estado de São Paulo (SOUESP), que várias vezes havia sido preso e sua libertação ocorrera por ordem direta de Vargas com quem mantinha relações cordiais.

Muitos terreiros surgiram do kardecismo ou foram fundados por espíritas que recebiam caboclos e pretos-velhos, especialmente foi marcante a influência da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, a qual funcionava no bairro de Neves, em São Gonçalo, fundada a 16 de novembro de 1908, seguindo inicialmente o Espiritismo codificado por Allan Kardec.

Em 1908, o médium Zélio Fernandino de Moraes, sob a influência do Caboclo das Sete Encruzilhadas,[7]recebeu a incumbência de fundar sete centros, os quais foram instalados na cidade do Rio de Janeiro, entre 1930 e 1937, com os nomes de Tenda Espírita. Ressalta-se que tenda, na época, eram as casas que funcionavam em sobrados, comuns na cidade, enquanto o termo terreiro era aplicado aos centros que funcionavam no mesmo plano da rua.

As sete tendas e seus responsáveis:

  • Tenda Espírita São Pedro - com José Meireles, em um sobrado da Praça XV de Novembro, Centro, fundada a 5 de março de 1935 e em funcionamento até 2012 na rua Visconde de Vila Isabel, 39, Vila Isabel.
  • Tenda Espírita Nossa Sra. da Guia - com Durval de Souza, na rua Camerino, 59, Centro. Fundada a 8 de setembro de 1927.
  • Tenda Espírita Nossa Sra. da Conceição - com Antônio Eliezer Leal de Souza, sem sede fixa. Fundada a 18 de janeiro de 1918.
  • Tenda Espírita São Jerônimo - com José Álvares Pessoa (Capitão Pessoa), na rua Visconde de Itaboraí, 8, Centro. Fundada a 9 de janeiro de 1935.
  • Tenda Espírita São Jorge - com João Severino Ramos, na rua Dom Gerardo, 45, Praça Mauá. Fundada a 15 de fevereiro de 1935. Casa de Ogum Timbiri. Foi a primeira das tendas de Zélio de Moraes a promover sessões de exu.
  • Tenda Espírita Santa Bárbara - com João Aguiar, sem sede fixa. Em outubro de 1952.
  • Tenda Espírita Oxalá - com Paulo Lavois, na atual Av. Presidente Vargas, 2567, Centro. Fundada a 11 de novembro de 1939.

Posteriormente a Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade passou a funcionar na cidade do Rio de Janeiro, na Praça Duque de Caxias, 231, e em 1960, na rua Dom Gerardo, 51. Atualmente se localiza na Cabana do Pai Antonio, em Boca do Mato, distrito de Cachoeiras de Macacu sob a direção da neta de Zélio, Lygia de Moraes Cunha. Das sete tendas, apenas duas se encontram em funcionamento até 2012. A Tenda Espírita São Jorge está sediada à rua Senador Nabuco, 122, em Vila Isabel com sessões às segundas-feiras. Já a Tenda Espírita Oxalá se localiza à rua Ambiré Cavalcanti, 298, no bairro Rio Comprido.

No período ainda surgiram vários centros como a Tenda Espírita Nossa Senhora do Rosário, Cabana Espírita Senhor do Bonfim (6 de setembro de 1939, ainda em funcionamento no bairro de Todos os Santos), Tenda Espírita Fé e Humildade (em setembro de 1941), Cabana Pai Joaquim de Luanda (Méier, 28 de julho de 1937), Tenda Espírita Humildade e Caridade, (em setembro de 1941), Centro Espírita Caridade de Jesus, em Vila Isabel, em 1932, Cabana Pai Thomé do Senhor do Bonfim (em setembro de 1941), Centro Espírita Religioso São João Batista (em setembro de 1941), Tenda Africana São Sebastião, Centro Espírita Caminheiros da Verdade (em 4 de março de 1932, no Engenho de Dentro), Grupo Espírita Humildes de Jesus (em 12 de dezembro de 1928) e muitos outros, desde a Praça Onze e Rio Comprido até os subúrbios mais distantes, especialmente nos municípios limítrofes do Rio de Janeiro.

A 26 de agosto de 1939 foi fundada a Federação Espírita de Umbanda sediada à rua São Bento, 28, 1° andar, na Praça Mauá, sob a presidência de Eurico Lagden Moerbeck. O órgão, de 19 a 26 de outubro de 1941, promoveu o Primeiro Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda. No encontro foi proposta a desafricanização da Umbanda com o intuito de fuga da repressão policial. A comissão foi composta por Jayme Madruga, Alfredo Antonio Rêgo e o escritor Diamantino Coelho Fernandes, membro da Tenda Espírita Mirim[8]. Como União Espiritualista Umbanda de Jesus (UEUJ), em 1944, teve papel preponderante na organização, edição e elaboração do livro O Culto de Umbanda em Face da Lei, entregue ao presidente Getúlio Vargas, no qual apresentava os anseios e direitos da comunidade religiosa perante a Constituição e a sociedade brasileira. Em 1947, seu nome foi alterado para União Espiritista de Umbanda do Brasil. Foi a primeira entidade federativa do país a congregar os centros já existentes. A União funciona atualmente à rua Conselheiro Agostinho, 52, em Todos os Santos. Foi também a responsável pela criação do primeiro periódico sobre o assunto, o Jornal de Umbanda, em 1947.

O objetivo principal na época era o de reunir as diversas tendas, a partir das sete primeiras, para uniformizar o culto umbandista, estabelecer o uso do branco no vestuário, homogeneizar as diversas classes participantes e as práticas ritualísticas de maneira simplificada dentro das diretrizes doutrinárias preconizadas nas bases estabelecidas, ao se criar estatutos e ordenamentos legais para evitar as terríveis perseguições ao culto. Se filiaram, entre outras, a Tenda Espírita Beneficente Santa Luzia, através do irmão Frederico, a Cabana Espírita Senhor do Bonfim, por Manuel Floriano da Fonseca, a Cabana de Pai Joaquim de Luanda, por Márcia Justino, além da Tenda Mirim, fundada em 1924, pelo médium do Caboclo Mirim, Benjamin Gonçalves Figueiredo. A histórica casa deixou inúmeras filiais, além do Primado de Umbanda, criado em 1952, compondo uma doutrinação disciplinar e hierárquica bastante contundente. Inicialmente localizada à rua Sotero dos Reis, 101, na Praça da Bandeira, se transferiu para a avenida Marechal Rondon, 597, em São Francisco Xavier, em 1942. Contava com vários colaboradores, entre os quais, o escritor Diamantino Coelho Fernandes, o Comandante Cícero dos Santos e Olívio Novaes. Já a Casa Espírita Caminheiros da Verdade, criada a 4 de março de 1932, e dirigida pelo Comendador João Carneiro de Almeida, se notabilizou como uma das mais influentes no estado. Está situada à rua Comendador João Carneiro de Almeida, 133, Engenho de Dentro, sob a liderança de Tarcizo Antonio Carneiro de Almeida.

A seguir foram criadas diversas tendas umbandistas, no dimensionamento doutrinário da Linha Branca, sob a orientação do Caboclo das Sete Encruzilhadas também em São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio Grande do Sul, Pará, Alagoas e Bahia. Não raro, Zélio de Moraes se fazia presente, ou enviava representantes à organização e direção das novas tendas umbandistas. No território brasileiro existem muitos templos que foram fundados direta ou indiretamente pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, incluindo outros que descendem dos originais. Um caso notório foi o do Tenente Joaquim Bentes Monteiro que solicitou a sua transferência para Belém do Pará a fim de fundar e dirigir a Tenda Santo Expedito.

Em 1940, é fundada por W. W. da Matta e Silva, a Escola Iniciática da Corrente Astral do Aumbhandan, a Umbanda Esotérica, na Tenda Umbandista Oriental (T.U.O.), em Itacuruçá, no estado do Rio de Janeiro.

Apesar do esforço inicial e ao longo da história por parte de autores, líderes e do próprio Caboclo das Sete Encruzilhadas de codificar, dogmatizar e unificar a ritualística da Umbanda, sempre foi evidente uma autonomia dos terreiros no que tange à prática do culto. O dirigente, também intitulado diretor espiritual, pai de santo, zelador ou sacerdote, em conjunto com o guia-chefe da casa, é o responsável pela própria forma de praticar a Umbanda de acordo com a sua formação, interesses e influências diretas ou indiretas.

A Umbanda pode ser considerada uma união de diferentes tradições religiosas representadas pelos vários grupos étnicos e sociais existentes no país, que são freqüentemente antagônicos. Contudo, os umbandistas têm freqüentemente uma atitude ambígua em relação às tradições afro-brasileiras, o que é refletido nas tendências sócio-culturais dominantes na sociedade.

A religião se originou na conjuntura de um período político bastante tumultuado que assistiu, entre outros fenômenos, a emergência de movimentos nacionalistas e fascistas. Esse desenrolar político culminou na ditadura de 1937, com o chamado Estado Novo, de Getúlio Vargas. O período de grande nacionalismo foi marcado pelo começo de ideologia da democracia racial. Gilberto Freyre, em Casa Grande e Senzala (1933) era um de seus defensores[9]. Segundo esse pensamento, o igualitarismo racial e seus vários grupos teriam tido igual importância na formação da civilização brasileira. De acordo com Diana Brown, em Umbanda: Religion and Politics in Urban Brazil, de 1994, página 206, se criou uma falsa crença de que o preconceito racial não existia no Brasil. Mas seus efeitos já se faziam sentir no fim dos anos 1920, com a nacionalização e institucionalização da cultura afro-brasileira. Práticas culturais, como o carnaval e as escolas de samba, que haviam sido relegadas ao mais baixo status por causa de sua associação com os negros foram então reconhecidas como componentes importantes da cultura nacional. Os estudiosos brasileiros também começaram a se interessar seriamente pela cultura afro-brasileira, que desde o início era vista de forma exótica e folclórica. Nesse ínterim, a ditadura aboliu os movimentos negros que lutavam contra a discriminação racial, a qual continuaria profundamente enraizada na realidade social brasileira.

O Espiritismo, especialmente o pejorativamente chamado baixo espiritismo representado pelas religiões afro-brasileiras, era ainda proibido por lei. Durante o período da ditadura, em que ocorreu também a formação da Umbanda, a perseguição às pessoas envolvidas se intensificou. Contudo, a repressão era voltada aos praticantes do então baixo espiritismo, ou seja, as religiões afro-brasileiras. Por conseguinte, os umbandistas, por questão de sobrevivência, passaram a se identificar com o termo espírita, usado apenas pelos espíritas kardecistas. Ao optarem por essa denominação, os praticantes se associaram com o Kardecismo e com o então chamado alto espiritismo. Portanto, o termo espírita foi amplamente utilizado como fuga da repressão e ainda para dissociar os praticantes das novas religiões de sua ascendência afro-brasileira, um gesto que recorda o uso do sincretismo católico nos cultos afro-brasileiros durante o período da escravatura[10].

A ideologia da democracia brasileira era legitimada e manifestada por uma hegemonia branca. Nesse contexto houve a primeira tentativa de legitimar a Umbanda como religião. A legitimação envolveu a desafricanização e o embranquecimento da Umbanda. Em 1939, alguns fundadores dos centros originais da Umbanda do Rio de Janeiro, inclusive Zélio de Moraes, estabeleceram a primeira federação de Umbanda, a União Espiritista de Umbanda do Brasil (UEUB). A federação foi criada para dogmatizar, unificar, defender e organizar a Umbanda como uma religião coerente e hegemônica e assim obter legitimação social. Em 1941, a União promoveu o Primeiro Congresso de Espiritismo da Umbanda, uma tentativa de definir e codificar a Umbanda como uma religião com direitos próprios que uniria todas as religiões, raças e nacionalidades. A conferência é ainda conhecida por promover maior dissociação com as religiões afro-brasileiras. Os participantes ainda concordaram em utilizar a obra de Allan Kardec como a doutrina operante da Umbanda. Entretanto, os espíritos considerados fundamentais, como os caboclos e o pretos-velhos ainda eram considerados espíritos muito evoluídos. Os participantes se esforçaram durante o encontro em legitimar a Umbanda como uma religião bastante evoluída. Declarou-se que que existia como uma religião organizada há bilhões de anos, e portanto estaria à frente de outras religiões[11].

No esforço em legitimá-la como uma religião original e evoluída, os participantes procuraram dissociá-la de suas raízes afro-brasileiras. A origem da Umbanda foi então traçada no Oriente de onde, se dizia, teria se espalhado para a Lemúria, um continente remoto e perdido, e daí para a África. No continente africano a Umbanda degenerou em fetichismo. Dessa forma foi trazida para o Brasil pelos escravos negros[12]. A influência africana da Umbanda não era negada, mas vista como corrupção da tradição religiosa original, na sua fase anterior de evolução. A Umbanda, teria ficado exposta ao barbarismo africano, na sua forma vulgar dos costumes, praticada por povos de costumes rudes, defeitos psicológicos e étnicos[13]. Outro jeito de sublinhar o caráter africano da Umbanda foi expresso no reconhecimento de que ela se originou na África, mas na África Oriental (Egito), portanto, na parte mais ocidental e civilizada do continente[14].

Um dos objetivos da conferência era o de traçar as raízes genuínas da Umbanda no Oriente. A invenção de raízes orientais, somada à negação das africanas, refletiu na definição do termo Umbanda, que se crê geralmente derivado da África. Declarou-se que Umbanda seria oriundo do sânscrito aum bhanda, termos que foram traduzidos como limitado no ilimitado, Princípio Divino, luz radiante, fonte de vida eterna e evolução constante[15]. Os participantes do congresso se esforçaram em associa-lá às tradições religiosas esotéricas europeias e as novas correntes religiosas da Índia, representadas pela Vivekananda.

A influência africana da Umbanda foi reconhecida como um mal necessário que serviu meramente para explicar sua chegada e desenvolvimento no Brasil. O Candomblé, centralizado no nordeste do Brasil, era olhado como um estágio anterior da Umbanda, que havia se desenvolvido no sudeste. O Candomblé, ainda notabilizado pela barbárie dos rituais africanos, era assim associado com a magia negra. A lavagem branca da origem da Umbanda era expressa em termos como Umbanda Pura, Umbanda Limpa, Umbanda Branca e Umbanda de Linha Branca associada à magia branca. Os termos faziam oposição à magia negra, associada ao mal. Ademais, criou-se uma espécie de divisão de espíritos. A linha daqueles que se encontram à direita, os bons, e os da esquerda, maus, representados pela magia negra. As únicas instâncias de identificação positiva da influência africana da Umbanda eram os pretos-velhos, considerados pessoas simples e humildes, mas espíritos muito evoluídos. Já a África era tida como um continente heroico e sofredor.

A atitude dos participantes em relação à herança religiosa africana era assim caracterizada pela ambiguidade. Elas eram positivas e negativas, oscilando da tentativa de dissocia-los das tradições religiosas africanas até sua atitude distintamente paternalista para com a África, a quem classificavam com a imagem de humilde escrava. Os negros brasileiros eram aceitos porque afinal tinham alma branca[16].

Em 1945, José Álvares Pessoa, conhecido como Capitão Pessoa, dirigente da Tenda Espírita São Jerônimo, obteve junto ao Congresso Nacional a legalização da prática da Umbanda. Segundo ele, em entrevista Leal de Souza, transcrita na página 439, do livro de Roger Bastide, As religiões africanas no Brasil, a fundação da Umbanda foi decidida em Niterói (estado do Rio) há mais de trinta anos, em uma macumba que ele visitava pela primeira vez. Até ali, ele fora um espírita kardecista. O pai de santo investiu-o dos poderes de presidente da Tenda de São Jerônimo, que deveria funcionar na capital, e lhe disse que importava organizar a Umbanda como religião.

Em 1947, surgiu o Jornal de Umbanda, que durante mais de duas décadas, foi o porta-voz doutrinário do culto umbandista, tendo como colaboradores Cavalcanti Bandeira, Olívio Novaes, J. Alves de Oliveira, W. W. da Matta e Silva, entre outros.

Em 1950, os defensores das práticas africanistas na Umbanda, liderados pelo tata ti inkice (sacerdote na etnia banto) Tancredo da Silva Pinto, relegados do primeiro congresso e da União Espiritista de Umbanda do Brasil, fundaram a Confederação Espírita Umbandista do Brasil, a qual existiu até 1967. Após a instauração do Regime Militar no país, a partir de 1964, a entidade vivenciou dificuldades de relacionamento entre elementos da sua administração. Tancredo, insatisfeito, desligou-se, vindo a constituir com outros companheiros, em 20 de Janeiro de 1968, a Congregação Espírita Umbandista do Brasil (CEUB). Após o falecimento de seu presidente e fundador, em 1979, seu braço-direito, Martinho Mendes Ferreira, assumiu a instituição, a qual seria entregue a Fátima Damas, a atual presidente, antes de morrer. É importante frisar que apesar das perseguições policiais, os defensores do africanismo continuariam as suas práticas, ao adicionar elementos, como o cavaquinho, e promover rodas de samba para iludir a repressão policial. Tancredo, através de uma coluna semana no jornal O Dia, recomendava uma forma africana para os rituais. Ele conquistou grande liderança entre os mais humildes.

Com o intuito de divulgar os cultos afros, Tancredo criou as festas religiosas de Yemanjá, no Rio de Janeiro, a festa a Yaloxá, em Pampulha, Cruzandê, em Minas Gerais, a festa do Preto-Velho, em Inhoaíba, homenageando a grande yalorixá Mãe Senhora, na cidade do Rio de Janeiro, a festa de Xangô, em Pernambuco, além do evento Você sabe o que é Umbanda?, realizado no Estádio do Maracanã, na administração de Carlos Lacerda, e finalmente a festa da fusão do estado do Rio de Janeiro com a Guanabara, realizada no centro da Ponte Rio-Niterói.

Em 1956, os representantes das duas correntes, superaram algumas divergências e formaram uma coligação que reunia as principais federações do Rio de Janeiro. A organização recebeu o nome de Colegiado Espírita do Cruzeiro do Sul e tinha a União Espiritista de Umbanda do Brasil como principal articuladora. Tancredo da Silva Pinto esteve presente e chegou a ser um dos presidentes. Por conseguinte, em 1960, os umbandistas ganharam força e conseguiram eleger vários candidatos em alguns estados. Em 1958, o falecido Átila Nunes, conceituado radialista e dono do programa Melodias de terreiro, fora eleito no Rio de Janeiro.

Relata Diamantino Fernandes Trindade, que ainda na década de 1950, houve a penetração no Rio Grande do Sul, através de Moab Caldas, que chegou a ser eleito deputado estadual. Ocorreu ainda uma rápida expansão para o estado de São Paulo. Pai Jaú, Sebastião Costa e o Tenente Vereda, que participaram do Primeiro Congresso de Umbanda, em 1941, já haviam criado a Liga de São Jerônimo no ano seguinte. Em 1953, foi registrada em cartório a primeira federação de São Paulo, a Federação Umbandista do Estado de São Paulo (FUESP), fundada por Costa Moura. Outras associações foram fundadas, tais quais, a União de Tendas Espíritas de Umbanda do Estado de São Paulo (UTEUESP), fundada por Luis Carlos de Moura Acciolli, o Primado de Umbanda, de Félix Nascente Pinto, a Associação Paulista de Umbanda, de Demétrio Domingues. Em 1968, a UTEUESP passou a registrar roças de Candomblé e mudou sua denominação para UUTEUCESP (União de Tendas Espíritas de Umbanda e Candomblé do Estado de São Paulo), sob a direção de Jamil Rachid. Em 1973, surgiu a FUGABC (Federação Umbandista do Grande ABC), dirigida por Ronaldo Linhares.

Em 1961, ocorreu o Primeiro Congresso Umbandista do Estado de São Paulo, organizado pelo General Nelson Braga Moreira. No mesmo ano aconteceu na Associação Brasileira de Imprensa (ABI) o Segundo Congresso Brasileiro de Umbanda, no Rio de Janeiro, presidido por Henrique Landi Júnior, eleito pelas comissões organizadoras, e secretariado pelo escritor João de Freitas. Ao assumir a presidência, passou a coordenar os trabalhos das comissões e reuniões preliminares em outros estados. Quando todas já estavam com suas teses elaboradas, ocorreu no Maracanãzinho, a 28 de junho de 1961, a festa de congraçamento, na qual compareceram cerca de quatro mil médiuns uniformizados, além de grande público assistente. Cavalcanti Bandeira apresentou a tese, aprovada, de que o vocábulo Umbanda é oriundo da língua quimbundo e significa "arte de curar". Nesse congresso o Hino da Umbanda foi oficialmente adotado em todo o Brasil em caráter oficial. Houvera sido composto por um cego, ainda na década de 1960, chamado José Manoel Alves, que em busca de sua cura procurou o auxílio do Caboclo das Sete Encruzilhadas. Mesmo não obtendo êxito, escreveu a letra para mostrar que era possível vislumbrar o mundo e a religião à sua maneira. Zélio de Moraes a apreciou tanto que decidiu apresentá-la no Segundo Congresso. Já a melodia foi composta por Dalmo da Trindade Reis[17].

De acordo com o escritor Diamantino Fernandes Trindade, em seu livro Umbanda Brasileira - Um século de história, de 2009: o Colegiado Espírita do Cruzeiro do Sul organizou o Segundo Congresso Nacional de Umbanda, em 1961, no Rio de Janeiro. Um dos objetivos desse evento era fazer uma avaliação das mudanças ocorridas no panorama umbandista nos vinte anos que se passaram desde o primeiro evento, em 1941. O Congresso ocorreu no Maracanãzinho e milhares de umbandistas estiveram presentes, incluindo dessa vez, representantes de dez estados e vários políticos municipais e estaduais. Esse evento foi organizado por Leopoldo Bettiol, Oswaldo Santos Lima e Cavalcanti Bandeira. A comissão paulista foi a mais numerosa e representativa, com a participação de Félix Nascente Pinto, General Nélson Braga Moreira, Dr. Armando Quaresma e Dr. Estevão Monte Belo. Neste congresso definiu-se a criação do Superior Órgão de Umbanda para cada Estado, congregando as Federações. Apenas o estado de São Paulo conseguiu criar o então chamado SOUESP (Superior Órgão de Umbanda do Estado de São Paulo) marcando presença no congresso posterior. Também nesse Congresso foi apresentada uma tese diferente da que havia sido veiculada no primeiro sobre a “Interpretação histórica e etimológica do vocábulo Umbanda”, tese apresentada por Cavalcanti Bandeira em contraponto a tese de Diamantino Fernandes, delegado representante da Tenda Mirim, que no Congresso de 1941 situava a palavra tendo origem em antigas civilizações e no sânscrito[18].

Na oportunidade se constituiu o SOUESP (Superior Órgão de Umbanda do Estado de São Paulo). Algumas discordâncias políticas fizeram com que outras federações se unissem em torno do Tenente Hílton de Paiva Tupinambá, em 1976, e fundassem o SOUCESP (Supremo Órgão de Umbanda e Candomblé do Estado de São Paulo) que se tornou forte oponente do antecessor.

Durante as décadas de 1960 e 1970 a Umbanda atrai olhares curiosos do mundo inteiro e se torna manchete de jornais e revistas. Muitos discos são lançados contendo os pontos cantados. Manchete e Planeta são publicações que destinam sempre notícias ou estudos sobre a religião, cujo exotismo despertava a atenção das pessoas.

Em 1973, foi realizado novamente no Rio de Janeiro, de 15 a 21 de julho, no Estádio de São Januário, o Terceiro Congresso Brasileiro de Umbanda, sob o comando de Cavalcanti Bandeira. No evento o dia 15 de novembro foi instituído como o "Dia Nacional da Umbanda", legitimando assim a manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas como fundador da religião e Zélio de Moraes como seu pioneiro, dois anos após o seu desencarne. Diamantino Fernandes Trindade relata a respeito em sua obra Umbanda Brasileira - Um século de história, de 2009: em 1973, realizou-se no Rio de Janeiro o Terceiro Congresso Nacional de Umbanda. A revista Mundo de Umbanda, número 1, de 1973, publicada pelo Primado de Umbanda, fazia referências às destemidas atuações de Cavalcanti Bandeira e outros umbandistas para a realização do evento. A revista citava: os umbandistas desejam consolidar o dia da Umbanda e preservar os rituais comuns e afins, proclamando o desejo de congregarem num colegiado nacional os órgãos associativos e federações estaduais, a fim de evitar as distorções e os abusos que são cometidos em nome da Umbanda. Segundo a revista, os temas propostos abordavam: Aspectos doutrinários e filosóficos; sincretismo religioso; teologias e crenças; moral e ética religiosas; práticas e rituais; iniciação e desenvolvimento; organização religiosa; música dança e cânticos; simbologia; aspectos administrativos; os cultos e a legislação oficial; órgão nacional inter federativo; temas livres e teses sobre a Umbanda. O Rio de Janeiro foi representado pelas mais importantes autoridades da Umbanda. São Paulo foi representado pelo SOUESP, por meio de seu presidente General Nelson Braga Moreira. Outros estados representados foram: Paraná, Rio Grande do Sul, Piauí e Santa Catarina. Wheatstone Pereira propôs a criação da Cartilha Umbandista e José Maria Bittencourt apresentou um trabalho sobre Casamento e Batismo na Umbanda, ambos aprovados por unanimidade. Nesse evento, a religião umbandista afirmou-se como uma das que mais crescem no Brasil e uma força significativa no campo das atividades sociais. Nessa época, diversos terreiros contavam com escolas, creches, ambulatórios etc. Após o Congresso foram fundadas onze novas federações, dentre elas a Associação Paulista de Umbanda e a Federação de Centros Espíritas e de Umbanda do Estado de São Paulo[19].

A 12 de setembro de 1977, no Rio de Janeiro, foi criado o Conselho Nacional Deliberativo de Umbanda (CONDU), estabelecido à rua Sá Viana, 69, no Grajaú, sob a presidência do General Mauro Porto. Seu objetivo que era o de agrupar as federações de Umbanda espalhadas pelo Brasil. O núcleo inicial era composto por cinco grupos: Confederação Nacional Espírita Umbandista dos Cultos Afro-brasileiros, Congregação Espírita Umbandista do Brasil, União Espiritista de Umbanda do Brasil, Primado de Umbanda e Federação Nacional das Sociedades Religiosas de Umbanda. Depois outras entidades se agregaram. Chegou a reunir 46 associações. Contudo, no decorrer da década de 1980, por conta da morte de dirigentes e a consequente extinção de várias federações, a entidade perdeu força e encerrou suas atividades. Sua fase de maior êxito ocorreu no decorrer da década de 1970 quando chegaram a integrar seu quadro o pesquisador e escritor José Beniste, a presidente e fundadora da Tenda de Umbanda Luz, Esperança, Fraternidade (TULEF), Lília Ribeiro, falecida em abril de 2004, o pai de santo e escritor, Ney Néri dos Santos, conhecido como Omolubá, o escritor Celso Rosa (Decelso da Congregação Religiosa Umbandista Brasileira, Loris Lugheri, da Cruzada Federativa de Umbanda de SP, o presidente da Congregação Espírita Umbandista do Brasil (CEUB), Martinho Mendes Ferreira, o campista José Raymundo de Carvalho, o presidente da Aliança Umbandista do Estado do Rio de Janeiro (ALUERJ), Floriano Manoel da Fonseca, Evaldo Pina e ainda membros de fora do estado do Rio de Janeiro, entre os quais, Carlos Alberto Dias Bellone (Confederação Umbandista do Paraná), Abrumolio Vainer (Círculo Umbandista do Brasil) (SP), Rosalvo da Cunha Leal (CNEUCAP – RJ), Asy Sgambato (Congregação Religiosa Umbandista Brasileira) (RJ), José Vareda e Silva (SP), Raymundo Viriato Baptista Rodrigues (AM), Guiomar Bussili (SP), Carlos Leal Rodrigues (PB), Marne Franco Rosa (RS), Joaquim Brito de Carvalho (SP), Djalma Rodrigues da Rocha (PI) e Flávio Nicolino (SC). Os arquivos do finado CONDU, que se encontravam em poder de Lília Ribeiro, passaram às mãos de José Beniste, o qual enfim os entregou aos cuidados de Fátima Damas, presidente da Congregação Espírita Umbandista do Brasil[20].

Durante a ditadura militar (1964-1985) a Umbanda obteve reconhecimento oficial e legitimação, por conta do projeto nacionalista. O regime diretamente apoiou a Umbanda para usá-la com o objetivo de manipular as massas, causando o desprezo dos que estavam na oposição ao governo.

Por volta de 1974 os praticantes de Umbanda, declarados e não declarados, foram estipulados em mais ou menos um quarto da população do Brasil.

A partir dos anos 1980, a Umbanda enfrentou forte oposição das igrejas neo-pentecostais, interessadas em se expandir e abarcar o maior número possível de fiéis. Começou o período de intensa decadência da religião. Ao iniciar suas atividades nos anos 50, a Igreja Evangélica Pentecostal ganhou muitos seguidores e influência na América Latina. Os pentecostais tentaram converter, e algumas vezes, perseguiram os seguidores da Umbanda e outras religiões afro-brasileiras. Alegavam que a Umbanda seria uma veneração aos demônios, além de prática de magia negra. Já a incorporação dos Orixás seria uma forma de possessão demoníaca[21].

Em 2005, no estado de São Paulo, a Umbanda ganhou uma decisão contra um canal de televisão patrocinado pelos pentecostais. O Ministério Público declarou ilegal que programas de televisão se referissem às religiões afro-brasileiras de forma derrogatória e discriminatória.

Ainda assim, as igrejas pentecostais converteram muitos umbandistas, especialmente entre as camadas mais desfavorecidas da população. Em meados dos anos 80, a favela Dona Marta, no Rio de Janeiro, contava com seis terreiros de Umbanda, um terreiro de Candomblé e um centro espírita. Surgiram no lugar oito igrejas neo-pentecostais[22].

Ainda hoje, apesar de existirem leis que reprimem o preconceito e a intolerância religiosa, os umbandistas enfrentam grandes preconceitos por parte da sociedade em geral. A intolerância não perdoa nenhuma faixa etária ou hierarquia religiosa, atingindo idosos, homens, mulheres e crianças, não respeitando sequer o principio universal de amor e compaixão para com o próximo e a total liberdade de crença[23].

Atualmente a Lei 11.635 referendada em 27 de dezembro de 2007 pelo ministro Gilberto Gil e sancionada pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva, estabeleceu o dia 21 de janeiro como o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa. Aponta-se essa data como provável causa da escolha, pois ocorreu o aniversario de falecimento da Mãe Gilda de Ogum, mãe-de-santo, que sofreu um infarto fulminante após ver seu nome e imagem atrelados a uma reportagem do Jornal Folha Universal da Igreja Universal do Reino de Deus em uma matéria intitulada Macumbeiros charlatões lesam o bolso e a vida dos clientes e ter seu terreiro invadido por fiéis neo-pentecostais[24].

No que diz respeito aos cultos religiosos de matriz afro-brasileiros, a Umbanda em especial, a grande maioria das pessoas é influenciada pelo senso comum de que a Umbanda é coisa do mal, primitiva e pagã. Aponta-se para tal repúdio diversos fatores, porém, o que chama mais atenção é a crueldade com a qual o Bispo Edir Macedo descreve a Umbanda. Em seu livro publicado pela Editora Gráfica Universal Ltda., no ano de 1990, intitulado Orixás, Caboclos e Guias: Deuses ou Demônios?, há uma análise preconceituosa, distorcida e ofensiva sobre a Umbanda e suas entidades. O que chama mais atenção para o conteúdo de tal livro, é a influencia que exercida sobre os seguidores de tal religião. Ele insufla seus fiéis a serem preconceituosos e a desrespeitar os umbandistas[25].

Edir Macedo é profícuo na publicação de obras polêmicas. No final da década de 80, sua obra Orixás, Caboclos e Guias: Deuses ou Demônios? foi recolhida por determinação judicial em vários estados brasileiros. A Justiça entendeu que o objetivo da obra era de propor uma ação persecutória aos adeptos das religiões de matriz africana, além de demonizar e reprimir as práticas da referidas religiões. Apesar disso ainda é possível encontrar a publicação em várias igrejas neo-pentecostais e na própria sede da IURD[26].

Sendo assim, fica nítido que o mau exemplo dado por um líder religioso como Edir Macedo só faz aumentar o preconceito contra as religiões de matrizes afro, e anula quaisquer possibilidades de erradicar a intolerância religiosa. Em uma sociedade cujo homem desfruta do livre arbítrio, o que deve predominar é o respeito à pluralidade e as diversas formas de manifestações divinas. Episódios tristes diariamente chamam nossa atenção no que concerne ao preconceito que os adeptos das religiões afros sentem. Terreiros constantemente são invadidos por fiéis das igrejas neo-pentecostais da Universal do Reino de Deus. Tal preconceito reflete nas ruas, nas escolas e em locais públicos como hospitais[27].

Em janeiro de 2013 a ministra Luiza Barros, de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, declarou que os evangélicos estão mais intolerantes e desejam acabar com as religiões de matriz africana[28].

O legado de Zélio de Moraes

Zélio de Moraes era branco, classe média, e filho de um espírita kardecista. Ele afirma que, em 1920, o espírito que encarnara como o jesuíta Gabriel Malagrita, o Caboclo das Sete Encruzilhadas se revelou a ele e lhe disse que ele seria o fundador de uma nova religião, genuinamente brasileira dedicada a dois espíritos brasileiros: O caboclo e o preto-velho. Ambas essas entidades eram frequentemente rejeitadas e tidas como atrasadas pelos kardecistas. Em meados dos anos 20, Zélio fundou seu primeiro centro de Umbanda e nos anos seguintes vários outros centros de Umbanda foram fundados por iniciativa do seu caboclo que assumira essa denominação porque não haveriam caminhos fechados para mim.

Como Zélio, os primeiros fundadores de centros de Umbanda eram antigos kardecistas e de classe média branca. Eles consideravam o Espiritismo Kardecista inadequado, pois eram médiuns de caboclos e pretos-velhos. Portanto, adquiriram gosto pelos espíritos africanos e indígenas da Macumba, os quais acharam muito mais competentes e eficientes que os espíritos kardecistas para o atendimento e cura de doenças. Além do mais, os rituais da Macumba eram considerados mais emocionantes que as sessões pouco ritualizadas do Espiritismo Kardecista. Se os então kardecistas foram inspirados por certos aspectos da Macumba, entretanto, repeliram outros, tais quais, os sacrifícios de animais, os exus, considerados espíritos ruins, além da conduta frequentemente grosseira e o ambiente social baixo dos centros de Macumba. (Brown 1994: 38-41). É importante frisar que a Tenda Espírita São Jorge, ao contrário das demais fundadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, sempre realizou sessões de exu, contrariando o ritual estabelecido.

Por seu turno, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, que comumente era chamado O chefe pelos seus adeptos, nunca permitiu que seu médium recebesse qualquer tipo de recompensa pelos trabalhos prestados. Portanto, ele nunca exerceu sua mediunidade como profissão. Trabalhava para sustentar a família e muitas vezes para manter as tendas fundadas pelo chefe, que dizia que a Umbanda é a manifestação do Espírito para a caridade.

Em 1967, após 59 anos de atividade junto a Tenda Nossa Senhora da Piedade, entregou a direção dos trabalhos às filhas Zélia e Zilméia, passando a viver no distrito de Boca do Mato, em Cachoeiras de Macacu, a 160 km do Rio de Janeiro, ao lado de sua esposa Dona Isabel, falecida em 1981, médium do Caboclo Roxo. Nesse recanto, privilegiado da natureza, continuou a atender os necessitados do corpo e da alma, na Cabana de Pai Antonio.

Segundo suas filhas Zélia e Zilméia, muitas vezes elas precisaram acolher desabrigados e doentes que seu pai trazia para casa e que de lá só saíam quando estavam curados. Não raro, ficava sem dinheiro para dar às pessoas que batiam à sua porta. Depois de 66 anos de mediunidade, Zélio faleceu no sábado, 3 de setembro de 1975, tendo podido dizer de cabeça erguida:

O Caboclo das Sete Encruzilhadas nunca determinou o sacrifício de aves e animais, quer para homenagear entidades, quer para fortificar a minha mediunidade... Nunca recebi um centavo pelas curas praticadas pelos guias. O Caboclo abominava a retribuição monetária ao trabalho mediúnico. Não há ninguém que possa dizer, no decorrer destes 66 anos, que retribuiu uma cura (e foram aos milhares) com dinheiro.

Ronaldo Linhares, presidente da Federação Umbandista do Grande ABC, gravou a última mensagem do Caboclo das Sete Encruzilhadas que na íntegra diz o seguinte:

Meus irmãos: sejam humildes. Tragam amor no coração para que vossa mediunidade possa receber espíritos superiores, sempre afinados com as virtudes que Jesus pregou na Terra, para que os necessitados possam encontrar socorro nas nossas casas de caridade. Aceitem meu voto de paz, saúde e felicidade com humildade, amor e carinho.

Fundamentos

Os fundamentos da Umbanda variam conforme a vertente que a pratique.

Existem alguns conceitos básicos que são encontrados na maioria das casas e assim podem, com certa ressalva e cuidado, serem generalizados. São eles:

  • A existência de uma fonte criadora universal, um Deus supremo, pode receber os nomes Zambi, Olorum ou Oxalá. Algumas das entidades, quando incorporadas, podem nomeá-lo de outra forma, como por exemplo Tupã, para caboclos, entre outros, mas são todos o mesmo Deus.
  • O compromisso com "a manifestação do espírito para a caridade".[29] O que significa que a ajuda ao próximo não ser retribuída em dinheiro ou valor de qualquer espécie.
  • Ritual variando pela origem.
  • Vestes, em geral, brancas.
  • Altar, gongá ou peji com imagens católicas, pretos-velhos, caboclos, baianos, marinheiros e boiadeiros.
  • Bases: africanismo, espiritismo, amerindismo, catolicismo.
  • Serviço social constante nos centros.
  • Magia branca.
  • O não sacrifício de animais.
  • Batiza, consagra e casa.
  • O culto aos orixás como manifestações divinas.
  • A manifestação dos guias para exercer o trabalho espiritual incorporado em seus médiuns ou "aparelhos", também chamados de "cavalos".
  • O mediunismo como forma de contato entre o mundo físico e o espiritual, manifestado de diferentes formas.
  • Uma doutrina, uma regra, uma conduta moral e espiritual que é seguida em cada casa de forma variada e diferenciada, mas que existe para nortear os trabalhos de cada terreiro.
  • A crença na imortalidade da alma.
  • A crença na reencarnação e nas leis cármicas.

A desafricanização da Umbanda

A cosmologia da Umbanda é dividida em três níveis: o mundo astral, a terra, e o mundo inferior ou submundo. O mundo astral é presidido por Deus, e é seguido por várias linhas. Cada uma é guiada por um orixá, que freqüentemente corresponde a um santo católico. O mundo astral é um lar hierárquico, onde cada figura religiosa é colocada segundo o seu nível de evolução espiritual. Nos níveis mais baixos, estão os fundadores espirituais da Umbanda: os caboclos e pretos-velhos. A Terra constitui a plataforma para espíritos que experienciam sua encarnação humana em diferentes níveis de evolução espiritual. Ela é visitada por espíritos do mundo astral, que são incorporados pelos médiuns nos centros de Umbanda para ajudar os mais necessitados. O submundo, freqüentemente denominado Quimbanda, foi anos ligado à magia negra. Representava uma anti-estrutura da Umbanda. De acordo com essa visão seria habitado por espíritos que viveram sua encarnação com caráter extremamente duvidoso, tais quais, prostitutas, malandros e ladrões. Eram vistos como maus por conta da falta de evolução espiritual. Tais espíritos podiam subir à Terra para causar danos que tinham de ser desfeitos pelos espíritos mais evoluídos do astral.

O exu foi elevado à categoria de importante trabalhador da Umbanda. E a Quimbanda como parte da Umbanda, diferenciando-se da Kiumbanda, na qual os verdadeiros espíritos inferiores, os kiumbas, seriam os agentes do mal. Os exus, portanto, seriam os responsáveis, não só pela proteção e vigília do terreiro, como os incumbidos de afastar os maus espíritos dos consulentes.

Os especialistas, que focalizam a desafricanização da Umbanda, tem procurado mostrar como a África e as tradições religiosas afro-brasileiras são reinterpretadas na sua cosmologia. Na Umbanda os orixás afro-brasileiros foram marginalizados e tem menos importância que no Candomblé, no qual todas em as cerimônias estão concentrados e são incorporados pelos filhos de santo. Nas cerimônias da Umbanda, os orixás normalmente são periféricos. Devido à sua posição elevada na hierarquia, eles permanecem na esfera astral. Porém, raramente são incorporados pelos médiuns a não ser na forma de falangeiros ou mensageiros. No entanto, em algumas casas os caboclos e pretos-velhos têm tomado na Umbanda a posição que os orixás tradicionalmente ocupam no Candomblé.

Desde o século XIX, existe uma tradição oral e escrita referente às figuras do caboclo e do preto-velho. O caboclo é geralmente descrito como o representante de um indígena inculto, selvagem e orgulhoso que se tornou símbolo da antiga idade do ouro do Brasil. Já o preto-velho é o representante do escravo africano. Tem sido enfatizado que apesar das diferenças, ambos são marcados pelo processo de aculturação e civilização, além de partilhar a experiência histórica comum de terem sido escravizados. A substituição dos orixás pelos pretos-velhos é interpretada como uma expressão do estrangeiro, África, sendo substituído pelo elemento nacional, Brasil. A substituição dos orixás orgulhosos e livres pelos pretos-velhos e escravos também tem sido concebida como um símbolo da transformação da África, de ter sido livre na África e se tornado escravo no Brasil. Essa substituição tem sido vista como uma instância de sua aculturação, domesticação e embranquecimento da identidade africana na sua transformação em identidade afro-brasileira e nacionalidade brasileira (Brown 1994: 37-38).

O brincalhão exu, que entre outras coisas representa o mensageiro dos orixás no Candomblé, é outra figura africana e afro-brasileira que foi reinterpretada e marginalizada inicialmente na Umbanda. Exu foi associado com o demônio antes da fundação da Umbanda. Nessa religião, entretanto, essa figura maligna foi complementada. Exu era considerado o representante do demônio, do perigo e da imoralidade. Por causa dessas peculiaridades, os primeiros umbandistas associaram exu com africanos e escravos rebeldes. Exu foi portanto segregado da Umbanda, e se tornaria o legislador da Quimbanda, do submundo. A mudança sobre a figura de exu sofreria mudanças positivas com o passar das décadas.

Outra reinterpretação umbandista já ultrapassada inseria exu na ordem evolucionista de precedência conforme o modelo kardecista. Era relegado a um espírito menos evoluído que precisava evoluir para se tornar um espírito bom. Alguns umbandistas ainda distinguem o exu pagão e o batizado, que se submeteu à doutrinação e encontrou o caminho certo da escalada da evolução. Esta distinção reflete algo do caráter original ambivalente de exu, apesar do rito de passagem do batismo, que define a distinção que é certamente novo. Novamente este batismo do Exu pagão tem sido interpretado como uma expressão e aculturação e domesticação do mal, do perigo e da imoralidade (Ortiz 1991: 137-144).

Culto aos orixás

Na Umbanda os orixás não incorporam, são periféricos, devido à sua posição elevada na hierarquia, eles permanecem na esfera astral. Porém, raramente são incorporados pelos médiuns a não ser na forma de falangeiros ou mensageiros. No entanto, em algumas casas os caboclos e pretos-velhos têm tomado na Umbanda a posição que os orixás tradicionalmente ocupam no Candomblé. Normalmente os orixás cultuados são Oxalá, Omolu, Iemanjá, Oxum, Nanã Buruquê, Oxóssi, Xangô, Ogum e Iansã.

Orisha é um termo yorubano que designa um ser sobre-humano ou um deus[30]. Sobre os orixás é considerado que são manifestações do Grande Deus, Olorum, criador de tudo.

Todo o universo surge de Olorum através das radiações que são individualizadas e personificadas em orixás. As emanações da água, por exemplo, podem ser subdivididas em Oxum, água doce, Nanã, pântano, e Iemanjá, mar. Ocorre associação semelhante com Ossain e Oxóssi no que tange à irradiação do reino vegetal. Portanto, cada orixá é considerado uma manifestação antropomorfizada dos elementos da natureza.

Por ocasião do tráfico negreiro e comércio de escravos no Brasil, negros de tribos diferentes foram misturados. Portanto, os diversas orixás de tribos distantes se encontraram em terras brasileiras e formaram o grande panteão do Candomblé.

Nessa visão, ainda própria dos ritos tribais, o orixá era um ancestral que os integrantes tribais localmente tinham em comum. Geralmente era o próprio fundador da tribo e deixava grande influência por suas características incomuns de liderança, poderes espirituais e habilidades. A tribo tinha no orixá um símbolo da união, pois todos eram filhos diretamente desse grande ancestral.

Os orixás, na Umbanda, se entrelaçam nas linhas de cultivo, que apresentam muita controvérsia em suas denominações e divisões, às quais abrangem reinos e falanges, de tal modo que não há uma unidade de entendimento, sendo geralmente distribuídas Sete Linhas encimadas pela Linha de Oxalá, sobre o que não há dúvida. Mais complexas se tornam as divisões em reinos e falanges, pois cada praticante procura explicar a seu modo e defender o seu ponto de vista, mesmo que esteja em desacordo com os demais. O orixá, pela sua vibração, influi na sua falange, dentro de sua linha em um mensageiro ou falangeiro que se manifesta nos terreiros de Umbanda.

Sincretismo

A Umbanda é uma junção de elementos africanos (orixás e culto aos antepassados), indígenas (culto aos antepassados e elementos da natureza), católicos (o europeu, que trouxe o cristianismo e seus santos que foram sincretizados pelos negros Africanos), Espiritismo (fundamentos espíritas, reencarnação, lei do carma, progresso espiritual).

A Umbanda prega a existência pacífica e o respeito ao ser humano, à natureza e a Deus. Respeitando todas as manifestações de fé, independentes da religião. Em decorrência de suas raízes, tem um caráter eminentemente pluralista, compreende a diversidade e valoriza as diferenças. Não há dogmas ou liturgia universalmente adotadas entre os praticantes, o que permite uma ampla liberdade de manifestação da crença e diversas formas válidas de culto.

Seu principal lema é dar de graça o que de graça receber com amor, humildade, caridade e fé.

Há discordâncias sobre as cores votivas de cada orixá conforme a região do Brasil e a tradição seguida por seus seguidores. Da mesma forma quanto ao santo sincretizado a cada orixá. Normalmente o sincretismo religioso de orixá e santo católico é feito da forma abaixo.

Alguns exemplos:


O culto umbandista

A Umbanda tem como lugar religioso o templo, centro, tenda ou terreiro, o local no qual os umbandistas se encontram em sessões, giras ou cultos para promover atendimentos espirituais por meio da incorporação dos seus guias e entidades.

O chefe é o pai ou mãe de santo, mais correntemente chamado de sacerdote umbandista. São os médiuns mais experientes e com maior conhecimento, normalmente fundadores do templo. São quem coordenam as giras e que irão incorporar o guia-chefe, que comandará a espiritualidade e a materialidade durante os trabalhos.

Como uma religião espiritualista, a ligação entre os encarnados e os desencarnados se faz por meio dos médiuns.

Na umbanda existem várias classes de médiuns, de acordo com o tipo de mediunidade. Normalmente há os médiuns de incorporação, que irão "emprestar" seus corpos para os guias.

Há também os ogãs que transmitem a vibração da espiritualidade superior por via do som dos atabaques e das curimbas ou pontos cantados, criando um campo energético favorável à atração de determinados espíritos, sendo muitas vezes responsáveis pela harmonia da gira.

Há os cambonos que são os que comandam os cânticos e as cambonas que são encarregadas de atender às entidades, provisionando todo o material necessário para a realização dos trabalhos.

Embora caiba ao sacerdote ou à sacerdotisa responsável o comando vibratório do rito, grande importância é dada à cooperação e ao trabalho coletivo de toda a corrente mediúnica.

De forma geral, as entidades que são incorporadas pelos médiuns são os guias: pretos-velhos, caboclos, crianças, boiadeiros, marinheiros, baianos, orientais, mineiros e ciganos. Nas sessões de Quimbanda: exus, pombagiras e malandros (no caso específico do Rio de Janeiro).

As sessões de Umbanda

O culto nos terreiros geralmente é dividido em sessões de desenvolvimento e de consulta e são subdivididas em giras.

Nas sessões de consulta o consulente terá o atendimento da entidade de acordo com a gira em vigor já pré-estabelecida em calendário, como as de pretos-velhos, caboclos, exus, marinheiros, baianos e ciganos. As pessoas conversam com as entidades a fim de obter ajuda e conselhos para suas vidas, curas, descarregos, e problemas espirituais diversos.

As ocorrências mais comuns nessas sessões são o passe e o descarrego. No passe, a entidade reorganiza o campo energético astral da pessoa, energizando-a e retirando toda a parte fluídica negativa que nela possa estar. Já o descarrego é feito com o auxílio de um médium, o qual irá captar a energia negativa da pessoa e a transferir para os assentamentos ou fundamentos do terreiro que contém elementos dissipadores dessas energias. Também a entidade faz com que essa energia seja deslocada para o astral. Caso haja um obsessor, o espírito obsidiador é retirado e encaminhado para tratamento ou para um lugar mais adequado no astral inferior, caso ele não aceite a luz que lhe é dada. Nesses casos pode ser necessária a presença de uma ou mais entidades para auxiliar na desobsessão.

Nos dias de consulta há o atendimento da assistência, o conjunto de pessoas que procura o terreiro para atendimento. Nos dias de desenvolvimento há as giras mediúnicas, fechadas, nas quais há estudos e aprimoramento dos novos médiuns.

Médiuns

Médium é toda pessoa que, segundo a doutrina espírita, tem a capacidade de se comunicar com entidades desencarnadas ou espíritos, seja pela mecânica da incorporação, pela vidência (ver), pela audiência (ouvir) ou pela psicografia (escrever movido pela influência de espíritos).

A Umbanda crê que o médium tem o compromisso de servir como um instrumento de guias ou entidades espirituais superiores. Portanto, deve se preparar através do estudo, para desenvolver a sua mediunidade, sempre prezando sua elevação moral e espiritual, a aprendizagem conceitual e prática do bem, do respeito aos guias e orixás, além da assiduidade e compromisso com sua casa, a caridade em seu coração, amor e fé em sua mente e espírito, e saber que a Umbanda deve ser vivenciada no dia a dia, não apenas no terreiro.

Uma das regras básicas da Umbanda é que a mediunidade não deve ser algo que envaideça o seu médium. Trata-se de um dom concedido que na realidade não lhe pertence para fins de resgate cármico e expiação de faltas pregressas antes de sua reencarnação. Por isso, nenhum tipo de mediunidade deve ser encarado como fardo ou como meio de ganhar dinheiro, mas como uma oportunidade valiosa para praticar o bem e a caridade.

Existem médiuns que se perdem no caminho da vaidade e do deslumbramento passando a agir de forma leviana. O médium deve conceber sua mediunidade como um meio de caridade e de amor ao próximo. Ter um comportamento moral e profissional dignos e ser honesto e íntegro em suas atitudes é uma obrigação. Caso contrário, atrairá forças negativas, obsessores ou espíritos não evoluídos que vagam pelo mundo espiritual na busca de encarnados desequilibrados que estejam na sua faixa vibracional. Por isso, o desenvolvimento da mediunidade é um processo que deve ser encarado de forma séria e vivenciado através de um profundo estudo da religião através de seus conceitos morais e éticos.

O médium deve fazer uso, sempre que necessário, dos banhos de descarga adequados aos seus orixás e guias, estar pontualmente no terreiro com sua roupa sempre limpa e recorrer ao chefe espiritual do terreiro quando tiver alguma dúvida ou problema espiritual ou material.

Uma grande parte dos centros ainda utiliza as obras espíritas codificadas por Allan Kardec, mas no decorrer do tempo houve uma proliferação de obras sobre várias vertentes de Umbanda. As listas de discussão e rede sociais da internet também têm contribuindo para a divulgação mais coesa da diversidade e da pluralidade existentes na religião.

O não sacrifício ritual de animais

A Umbanda não recorre aos sacrifícios de animais para assentamentos vibratórios dos orixás, tampouco realiza ritos de iniciação para fortalecer o tônus mediúnico com sangue. Não tem nessa prática legítima de outros cultos, recursos de oferta às divindades. A fé é o principal fundamento religioso da Umbanda, assim como em outras religiões.

Suas oferendas se diferenciam das demais por serem isentas de sacrifícios de animais pelo fato de preconizarem o amor universal e, acima de tudo, o exercício da caridade como reverência e troca energética junto aos orixás e seus enviados, os guias espirituais. É incompatível ceifar uma vida e fazer a caridade, que é a essência do praticar amoroso que norteia a Umbanda.

Paramentos

Na Umbanda os médiuns usam normalmente como paramentos apenas roupas brancas, podendo estar os pés descalços, o que representa a simplicidade e a humildade, atributos comumente aludidos ao culto.

Há vertentes que optam pelas cores do orixá homenageado ou guia. É possível que em determinadas casas uma preta-velha solicite uma saia ou um lenço para amarrar os cabelos, ou vista uma roupa diferente da habitual. Em alguns terreiros são permitidos determinados apetrechos para os guias. Os caboclos costumam utilizar cocares, machadinhas de pedra ou chocalhos. Alguns terreiros concebem a ideia de que nas giras de exu as roupas podem ser pretas e vermelhas. O ritual é variável de acordo com a orientação espiritual da casa e de seu sacerdote.





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