quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Os desígnios a Èsù na criação do Àiyé


No Òrun, no princípio da criação do Àiyé (terra) e do homem, Olódùmarè diz a Èsù: 

"Meu mensageiro!

Quando te criei, coloquei em ti a ambiguidade de caráter.
O bem e o mal necessitam-se mutuamente para que possam existir, da mesma forma que a luz não pode ser percebida se não existirem trevas. Esta é a regra da criação. Todas as coisas que aparentemente se opõem, na verdade se complementam. Se completam e se integram para que haja o equilíbrio.
Tua palavra, como tua ação, nada mais é do que a confirmação do que está por mim determinado desde sempre.

A ti outorgo o título de Elegbara, que significa Aquele que Possui Poder Ilimitado."



Olodumare provera Èsù de espírito moleque e zombeteiro, de inteligência e astúcia superiores a qualquer outro Òrìsà, além de ter a missão de funcionar como o agente mágico universal, o grande transformador, responsável pelos diferentes aspectos e formas assumidos pela matéria. Concedera-lhe ainda o poder ilimitado de se multiplicar em milhares de Èsù, sendo todos, ele mesmo.

Nada viveria, nada teria forma, segundo seus planos, sem possuir seu próprio Èsù, individualizado, mas parte integrante do Èsù principal, Agba-Èsù (Èsù ancestral, o mais velho). E por este motivo, concedera-lhe o título de Ijelu, associado ao Okotó, caramujo cônico formado por espirais que se desenrolam infinitamente.

Dentre os inúmeros poderes conferidos a Èsù, Olódùmarè permitiu que ele se desdobrasse em 1.201 unidades, podendo, sempre que quisesse, acrescentar a esse número mais uma unidade, o que eleva ao infinito a possibilidade do desdobramento de Èsù. E aí está contido o mistério de sua associação ao número 1.



Em conversa com Òrúnmìlà, este diz a Èsù:
_ "És fundamental dentro do sistema, e seja qual for o culto, a qualquer que seja o Òrìsà, estarás também sendo cultuado de forma muito especial. Nenhum procedimento religioso será aceito sem que tu sejas homenageado em primeiro lugar.


Tu serás o último dos Òrìsà que a sucumbir diante de Iku, pois, a partir do momento que isso ocorrer, tudo no Universo se desintegrará. As formas materiais deixarão de existir e o vazio absoluto tomará conta de todos os espaços.

Tu, Èsù, és a energia que reúne os átomos, possibilitando a diferenciação da matéria e, por este motivo, todas as coisas e todos os seres vivos possuirão uma parte de ti, e, para tanto, deverás multiplicar-te infinitamente, sem perder a qualidade e o poder de tua essência primordial, por isto teu nome – Èsù – Significa esfera." Explicou Òrúnmìlà .

Èsù responde:
_"O que me dizes, Mestre dos Sábios, me assusta e ao mesmo tempo me envaidece. Não gostaria, apesar de tudo, de ser obrigado a modificar meu caráter ou de ter que abandonar meu jeito brincalhão de encarar os acontecimentos, por mais sérios que sejam. "

_"Como poderias deixar de ser como és, se esta é a vontade de Olódùmarè? É aí que reside teu poder. Sentimento algum irá, jamais, alterar a tua conduta ou a tua maneira de ser. Por este motivo deverás funcionar como árbitro, policial, carrasco e dispensador. Serás o prêmio e o castigo, não só dos seres materiais, como também das entidades espirituais. Todos, com exceção de nosso Pai (Olódùmarè), serão submetidos por tua ação.

Serás visto por muitos como um espírito rebelde, que contesta o poder de Olódùmarè e, em muitos casos, servirás de arma do homem contra ele próprio, que, associando-te ao mal, tirará partido da ignorância de seus semelhantes para manipulá-los e explorá-los das mais diversas formas. Alguns dos teus fiéis, mesmo sem a plena compreensão da tua verdadeira função, usarão teus nomes para praticar o mal, e te confundirão com a prática condenável da magia negra e da feitiçaria." _ continuou Òrúnmìlà.
Exclamou Èsù:
_"Saberei como tratar essa gente! Ah, sem dúvida saberei..."

Òrúnmìlà concluiu:
_ "Tenho certeza que saberás, pois és sábio em tuas molecagens."






(Extraído do livro "Igbadu, A Cabaça da Existência: Mitos Nagôs Revelados" de Adilson de Oxalá, com adaptações)

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