Dos caminhos da tradição
Certo dia li um texto escrito pelo Leonardo Boff chamado “O caminho como arquétipo”. Como sempre, os textos do Boff me fazem refletir sobre a temática que ele aborda mesmo eu exercendo a espiritualidade sob a vivência do Candomblé e quase sempre relaciono uma coisa ou outra ao meu mundo religioso, especificamente. O trecho abaixo é exatamente o elo desta relação:
“No caminho de cada pessoa trabalham sempre milhões e milhões de experiências de caminhos passados e andados por infindáveis gerações. A tarefa de cada um é prolongar este caminho e fazer o seu caminho de tal forma que melhore e aprofunde o caminho recebido, endireite o torto e legue aos futuros caminhantes, um caminho enriquecido com sua pisada.” (O caminho como arquétipo, Leonardo Boff)
Eu poderia dizer que o caminho da nossa tradição religiosa é basicamente tudo isso contido neste trecho, e assim, continuar este caminho deveria ser uma obviedade, um acontecimento natural. Porém, a minha ingenuidade não é tanta ao ponto de reconhecer que isso acontece regularmente. Os tantos comentários que recebemos mostram que algué(ns) se perderam dos caminhos que os antecederam e vêm pondo os caminhos futuros dos descendentes a perder. E a religião também perde com isso.
Eu tenho algumas hipóteses sobre esses “desvios” e uma delas é o “auto-endeusamento” por parte de alguns zeladores. Explico: Candomblé é submissão, submissão ao orixá, é pelo orixá que oris de 1 ou de 100 anos encostam na terra como respeito e submissão. De certa forma, o respeito ao orixá iguala todo mundo da escala hierárquica, neste caso. A primeira e a última palavra vêm sempre do orixá. Mas alguns zeladores se dão tanta importância que passam a decidir por ele e descartam o caminho que veio antes dele, desconsideram a tradição em nome de uma assinatura “na minha casa é assim”, como se customizar o culto fosse algo saudável a religião como unidade.
A conseqüência disso a gente já sabe e já vê: filhos perdidos que olham para trás e veem tudo difuso, embaçado e sem certezas sobre os próprios caminhos. Não basta o preconceito que ainda sofremos e a intolerância, ainda temos esses graves problemas internos sem nenhuma perspectiva de realmente serem sanados.
Enquanto os caminhos não são respeitados, vemos filhos perdidos e amedrontados com concepções absurdas sobre os conceitos que pertencem ao Candomblé e zeladores com um rei na barriga deturpando à sua própria “marca” uma religião que tem caminhos longos trilhados em cima de muito sacrifício e tradição.
Logicamente há mais hipóteses e cada um de vocês pode enxergar alguma diferente da minha citada aqui. Restringi-me a esta somente, pois é a que mais me irrita de forma enfática (muito enfática) e tem me feito repensar o simples ato de visitar certas casas.
Axé.
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