domingo, 24 de março de 2013

A vida em um terreiro é uma lição de ética, moral e comportamento.


Leitores,

Sempre estamos postando também textos que não são de nossa autoria por vermos que as ideias que eles querem passar se assemelham com as ideias que fazem deste blog uma unidade. No decorrer destes anos me parece que este caminhar tem dado certo, pois já atingimos dez milhões de leitores (isto mesmo: 10.000.000,00).
Recebi este texto por e-mail enviado pelo Pai Fernando dizendo que foi adaptado pela Iyalorixá Suami Portinhal para que fosse publicado aqui no blog e ainda por cima ele me incumbiu de fazer algum prefácio. Não sou editora e nada além para fazer um prefácio. Só posso dizer que a Iyalorixá Suami Portinhal é uma figura que eu “conheço de vista”, virtualmente, nunca falei e nem vi, mas sempre li algumas coisas dela pela internet, sempre gostei muito e hoje ela está aqui nos presenteando com uma indicação de um texto ótimo, coerente, elucidativo e, o melhor, real, pois retrata o que muito vem acontecendo na nossa comunidade quanto às questões comportamentais e aos valores que realmente pertencem ao Candomblé e aos valores que vêm sendo enxertados, confundindo nossos conceitos.
Só posso dizer uma coisa: que a Iyalorixá Suami Portinhal nos brinde mais vezes com mais indicações e também futuros textos de sua própria autoria. Será um prazer para nós.
 Mutunbá!
Dayane
A vida em um terreiro é uma lição de ética, moral e comportamento.
Candomblé não pode ser associado a uma religião sem ética e moral. Não a religião. A vida em um terreiro é uma lição de ética, moral e comportamento. Entretanto, mesmos nas casas mais tradicionais ainda há uma linha de pensamento na qual o próprio babalorixá diz: “não me interessa o que aquela pessoa faz do portão para foram, mas sim do portão para dentro”. Lamento, minha opinião é que quem diz isso está errado, muito errado.
Sim, importa sim o que a pessoa faz em qualquer lugar e em qualquer hora do dia. O candomblé não é um religião de igreja, você pratica ela todo o seu tempo. Não temos templo, o templo é o mundo e a gente está com o orixá o tempo todo. Assim o comportamento de uma pessoa importa sim.
Não existe o sentido secular, a separação entre o sagrado e o laico no candomblé. A religião é a continuidade de nossa vida e o terreiro é apenas um momento em que as pessoas se reúnem. Cerimônias podem ser feitas em qualquer lugar e alguns consideram que são até mais intensas quando se está em contato com o mundo natural. Desta maneira, uma pessoa não pode dizer que não interessa o que um adepto faz do portal para fora. Essa pessoa do portão para fora tem que ser a mesma do portão para dentro. Mais uma vez sou obrigado a dizer que pessoas que dizem que o que o membro de sua casa faz do portão para fora não o interessa é uma pessoa desinformada, não sabe o que se espera de uma religião e de um sacerdote.
Sob o ponto de vista conceitual, para podermos entender a ética da religião a gente tem que se mirar em duas coisas: a primeira é o conteúdo do ensinamento formal que esta nos ésé de Ifa e também nos itans, e mitos regionais. Essas histórias traduzem conceitos éticos e morais da religião.
O cuidado é não usar os mitos deturpados e estragados que circulam por aí e que servem apenas para transmitir e justificar vilanias. Dessa maneira, estudar esses mitos e itans é uma parte fundamental do aprendizado religioso. Nesse sentido as pessoas mais velhas são aquelas que aprenderam mais histórias e mesmo sem terem podido escrevê-las elas podem contar para os demais. Um mais velho legítimo é aquele que sempre atrai em torno de si pessoas mais novas ávidas por ouvirem suas histórias e casos e é uma pessoa sempre com conhecimento para transmitir, mas conhecimento que não sejam apenas vaidades pessoais, porque também já vi muita gente que a única coisa que faz é repetir histórias sobre si mesmo. Igualmente pessoas cuja única coisa que têm a contar são críticas, comentários pejorativos e patifarias que viu em outras casas é uma pessoa sem conteúdo que perde sua vida andando por lugares que não merecem a presença de ninguém. Eu penso assim, se você vai a um lugar e vê uma coisa ruim ou feia, a primeira coisa é “o que você esta fazendo lá?” Se esta lá é igual aos demais.
Mas a moral e ética das histórias e versos não são uma coisa simples e previsível. É muito diferente da moral cristã e muito mais humana, muito mais permissiva a certos aspectos comuns da vida de todos. Ela não espelha pessoas santas e puras e sim pessoas normais que acertam e erram. A astúcia é uma coisa bastante permitida.
Eu posso afirmar que em todas as histórias que li nunca vi nada que mostrasse um exemplo de comportamento que não fosse ético ou digno. Pelo contrário é exigido que as pessoas sejam de fato corretas e úteis para a família e sociedade. Assim, não consigo encontrar justificativa para a classificação de antiética e amoral do candomblé.
Eu entendo sim que existem pessoas antiéticas e amorais que são babalorixás e iyalorixas e que espalham por aí besteiras e nulidades. Na verdade mercadores de feitiçaria, gente que nas histórias que li sempre eram as pessoas ruins, não as boas. Essas pessoas que vendem facilidades e prosperidades que elas mesmas não têm em seus feitiços furados são as que menos interessam por qualquer ética e moral.
Outro aspecto da moral é o qual seria moral da sociedade yoruba e que se reflete na religião e nos mitos regionais. Isso é natural em qualquer religião: a sociedade que a gerou influencia a sua ética. Da mesma maneira tudo o que eu pude observar sobre a ética da sociedade – e fiz algum esforço nisso – apontam para o reflexo que temos nos ésé e itan.
Essa é minha visão. Reconheço que o mundo conspira contra ela e que a atitude das pessoas é que conduz a essa classificação amoral. Reputo isso ao despreparo dos que têm cargo e também a conveniência de ter justificativa para fazer o que quiser. Muitos devem saber que existe um mau comportamento de pessoas que entram para um terreiro, fazem o mínimo de obrigações e abrem sua casa. A maior parte não busca nem aprender, seja por falta de esforço ou de interesse os mitos da tradição oral, gosta de dizer que o Candomblé é uma tradição oral apenas para justificar o fato que não querem buscar conhecimento que não tem. Muitos vêm de umbanda e trazem uma carga de conceitos católicos e espíritas e se consideram espíritas, acreditam naquela bobagem de karma, etc. O problema com esse grupo é que procuram usar os conhecimentos de outras religiões porque não procuram os da sua, mas reagem a ética e moral dessas religiões porque são do candomblé. Eu acho que já que elas são candomblecistas- que usem os itans de Ifá ao invés dos ensinamentos doutrinário-espírita de outras religiões. Fica mais coerente.

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